G. Alvarado
Há poucos dias, o diretor-executivo do consórcio aeroindustrial Boeing, Dennis Muilenburg, confessou que tinham ocultado às entidades reguladoras do setor, às companhias aéreas e aos pilotos dos aviões 737 Max que um dispositivo instalado nesse modelo não funcionava como estava previsto.
Muilenburg disse que a causa direta de dois desastres, um em Jakarta em outubro de 2018 e outro na Etiópia em março passado, tinha sido um “erro”. Nos acidentes morreram as 346 pessoas que estavam a bordo das aeronaves.
Desesperada pelo avanço no mercado mundial dos aviões A320 NEO de sua rival europeia Airbus, a Boeing decidiu instalar motores mais potentes na nova versão do tradicional 737. Porém, tentando evitar que a força das turbinas fizesse elevar rápido demais o focinho do aparelho na hora de decolar, o fabricante criou um mecanismo para forçá-lo a manter a posição correta.
Porém, não explicou aos reguladores de segurança nem aos pilotos essa modificação nem os procedimentos necessários para corrigir a posição da aeronave caso fosse necessário. Essa foi a razão pela qual as duas despencaram antes de alcançar a altura de voo.
Falando claro: o executivo da Boeing não admitiu um simples “erro”, como quis mostrar à opinião pública, e sim confessou o homicídio de 346 pessoas por um só motivo: abocanhar um mercado que gera lucros de bilhões de dólares.
Ao invés de ficar passeando pelo Salão Internacional da Aeronáutica, em Paris, Muilenburg deveria ter sido preso enquanto são investigadas outras falcatruas das quais seria responsável. Mas isso é difícil que ocorra.
A Boeing é a segunda maior companhia do mundo ligada ao complexo militar industrial, só ultrapassada pela também norte-americana Loockheed Martin. Fabrica aviões de combate tripulados e não tripulados, do tipo drone, sistemas de defesa e inteligência via satélite, foguetes e helicópteros, como os Chinook e Apache.
O Instituto Internacional de Investigações para a Paz, de Estocolmo, indicou que em 2016 as vendas da Lockheed alcançaram o valor de 47,2 bilhões de dólares, e as da Boeing 29,5 bilhões.
Ninguém pode acreditar que o aparato de justiça dos EUA vá processar e condenar um dos elementos chave do complexo militar que permite a essa nação manter sua hegemonia em pontos nevrálgicos do planeta. Gente desse tipo está acima da lei, mesmo tendo de enfrentar as demandas de centenas de companhias aéreas que hoje sofrem prejuízos porque as aeronaves 737 Max estão paralisadas no solo à espera da solução ao problema.
Lamentavelmente, a concorrência selvagem das grandes corporações gera “erros” desse tipo, que seriam considerados crimes se não estivesse presente o enorme volume de dinheiro capaz de fazer balançar qualquer sistema de justiça.