Infância roubada

Editado por Irene Fait
2022-01-19 18:19:08

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Retratos de vítimas. Museu da Memória e Direitos Humanos. Santiago do Chile. Carlos Teixidor Cadenas. Licencia Creative Commons.

Um dos problemas que vai herdar Gabriel Boric, quando assumir a presidência do Chile em 11 de março, será a escabrosa questão dos milhares de crianças roubadas de suas famílias durante a ditadura de Augusto Pinochet, de 1973 a 1990.

Não se sabe ao certo o número de vítimas desse negócio, mas uma investigação ordenada pela Suprema Corte de Justiça, que dirigiu o perito em direitos humanos Mário Carroza, tirou a conclusão de que houve, no mínimo, vinte mil casos.

A imensa maioria daqueles bebês foi adotada por famílias no exterior, mediante pagamentos que oscilaram entre sete mil e 150 mil dólares. O dinheiro embolsado foi repartido entre advogados, funcionários do governo, médicos e trabalhadores de creches, que compunham a rede.

Um artigo assinado por Dominique Galeano e publicado recentemente pelo jornal argentino Página 12 revela que muitas crianças foram enviadas aos Estados Unidos, Suécia, Itália e França, entre outros países.

O articulista detalha: os bebês eram roubados enganando as mães, quase sempre pobres e iletradas. Davam jeito para que assinassem documentos que não compreendiam, ou simplesmente lhes mentiam, diziam que seus filhos tinham nascido mortos.

Igualmente se falsificaram documentos e provas com o propósito de declarar os pais incapacitados para criar seus filhos, tirar deles o pátrio poder, e supostamente mandar as crianças a casas de acolhimento para menores.

Sem dúvida, são crimes perversos. Há indícios de que também foram cometidos na Espanha durante a ditadura de Francisco Franco, e em alguns países da América Central.

As primeiras denúncias no Chile foram publicadas pelo Centro de Investigação Jornalística, em 2014, embora, de acordo com Galeano, havia reclamações de algumas famílias que apontavam um sacerdote católico como intermediário em adoções ilegais.

Hoje em dia, existe um plano piloto para localizar 700 crianças, realizar indagações e testes ADN dentro e fora do Chile, porém se trata de uma ação mínima se comparada com a quantidade de vítimas.

Karen Alfaro, pesquisadora da Universidade Austral, assinalou que o regime de Pinochet fez das adoções irregulares política de Estado para “melhorar        “ suas relações com segmentos da direita e extrema-direita de outros países, especialmente Suécia.

O governo de Boric terá de trabalhar duro para dar respostas a milhares de famílias que estão tratando de reconstruir sua história, despedaçada de maneira brutal e perversa pela ditadura.

 



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